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Cristiano Ronaldo levou o nome de Portugal até aos confins do mais recôndito recanto do Planeta Terra.
Cristiano Ronaldo foi, durante décadas, fogo de artifício para os olhos de milhões de amantes de futebol, e mesmo até daqueles que não ligam ao desporto rei, em todos os países de todos os continentes. Ronaldo cabe, a par de mais uns poucos eleitos, nos dedos de uma só mão entre os melhores interpretes deste desporto que, a breve trecho, completará 150 anos de época moderna.
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Cristiano Ronaldo nasceu numa família pobre. A mãe era empregada de limpezas. O pai sofreu de problemas relacionados com adições e deixou o(s) filho(s) demasiado cedo. Ronaldo, ainda criança, abandonou a pacatez da sua Ilha da Madeira para rumar à sempre agitada Lisboa, em busca de um sonho. Foi, podemos dizê-lo, trabalhador infantil. Trabalha desde que tem memória. E trabalha muitíssimo. Todos os dias. Ronaldo chorava à noite, sozinho, na cama de uma velha pensão no impessoal Marquês de Pombal.
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Cristiano Ronaldo começou por bater recordes da modalidade e, sem que se percebesse o tempo passar, já lutava por ultrapassar os recordes que passavam a ser quase todos seus. Ronaldo deu a todas as equipas por onde passou alegrias que serão, enquanto formos vivos, e mesmo depois disso, inolvidáveis para esses adeptos, e até para os seus mais acérrimos rivais.
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Ronaldo sempre foi o primeiro a chegar ao treino e o último a sair. Ronaldo marcou golos em todos os minutos que cabem dentro de uma partida de futebol. Ronaldo quis sempre mais e melhor, e foi em busca disso. E conseguiu-o sempre.
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Ronaldo foi vítima de todo o tipo de aproveitamento, dada a sua ascenção meteórica além fronteiras. Ronaldo ganhou rios de dinheiro, dinheiro à escala do seu talento, do seu esforço, e da sua dedicação à profissão que escolheu abraçar. Que sabemos que paga bem demais a quem é demasiado bom.
Ronaldo tornou-se estratoesférico. Subiu mais alto do que todos os outros. Mas, ao invés das frágeis asas de Ícaro, as suas ultrapassavam todos os limites. Dentro e fora de campo.
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Ronaldo passou toda esta sua vida a ajudar quem mais precisava. Sem necessidade de o promover. Porque, parecendo que não, Ronaldo é um ser humano. Como nós todos. Mas será, possivelmente, o ser humano à face da Terra mais exposto a um teste social que mais parece ser um exame onde todos o pressionam a passar com brilhantismo.
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Ronaldo não tem direito a irar-se. Ronaldo não pode sair mais cedo do campo, mesmo depois de ter estado a festejar com os companheiros a vitória de Portugal.
Ronaldo não tem direito a estar triste. A ter um dia, ou uma fase da sua vida, em que se sente mal, ou frustrado consigo próprio. Por se exigir continuar a ser o melhor.
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Ronaldo é acusado, nos dias que correm, de quase tudo: de ingratidão, de egocentrismo, de desrespeito, de falta de educação, de indiferença. Uma campanha como poucas - urdida não sei por quem - mas que rápidamente pegou fogo ao enorme pasto das redes sociais. O maior palco que a humanidade descobriu para verter ódio sobre tudo e todos. E não quero armar-me em exemplo de nada. Eu também tenho os meus ódios. Todos temos. Porque somos seres humanos. Com virtudes e defeitos. Com dias bons e dias maus. Com estados de espírito diversos. Somos assim. E o Ronaldo também é.
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O Ronaldo sofreu a morte do Pai. E, pior, sofreu a morte de um filho. Lutou sempre contra todas as adversidades com tanta ou mais força quanto a que elas traziam, colocando o foco na sua profissão. Fazendo o que nunca antes dele o comum dos jogadores nem sonharia fazer.
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Ronaldo é um ser humano como nós. Tu e eu. Mas teve o destino de ser endeusado pelo mundo inteiro. Agora tentem imaginar como lidariam com essa condição. Anos e anos a não poder sair à rua, com milhões pelo mundo inteiro a fazer vénias à sua passagem... não é isto um desafio enorme às qualidades mentais e psicológicas de um ser humano? Aplicamos-lhe exactamente o mesmo juízo de valor que usaríamos para um comum mortal, como eu e tu?
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Muito correcto consegue ser Ronaldo. Se fosse comigo, se me fizessem sentir o rei do mundo, em todo o mundo, há um mundo de anos, à mínima contrariedade poderia ser capaz de partir a montra dos bolos, só porque o café não vinha à temperatura ideal. Mas não. Ronaldo não partiu nada.
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Ronaldo, sem ofender ninguém, manifestou a sua frustração por ser substituído. Justamente quando tudo não lhe corre bem. Com sangue quente. E não sentado no sofá da nossa sala com o teclado na mão. Mas cansado e com a adrenalina a latejar-lhe nas veias. Ronaldo saiu mais cedo do campo, quando ainda decorriam os festejos dos colegas. A Ronaldo não lhe é permitido sentir-se silencioso, pensativo, introspectivo, mesmo depois de festejar com toda a equipa.
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Ronaldo é apenas o ser humano mais conhecido, mais seguido e mais vigiado a todas as horas no planeta. E como se isto, só por si, fosse de pouca monta, ainda tem de satisfazer, em todas as situações, os padrões morais e exigências éticas de milhões por todo o mundo.
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Ronaldo está a atravessar uma fase difícil. Mas aqueles que outrora gritavam o seu nome quando arrastava a selecção nos ombros sabem agora, e somente, atirar-lhe pedras. E pontapear com mais força à medida que Ronaldo se encolhe. E se já estiver no chão, tanto melhor. Isto tudo ao passo em que hordas de gente de todas as nações paga somas exorbitantes para o verem jogar. Gritam o seu nome alto e bom som. E de Portugal apenas conhecem vagas fotografias de revistas de turismo.
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Somos um país estranho. Talvez Ronaldo não devesse ter nascido português. Fora ele brasileiro ou argentino, e já seria, para muitos de nós, o melhor de sempre. Mas não. Ronaldo é português. Como eu e tu. E, por baixo da capa de super-herói que lhe vestimos - todos nós - estará certamente uma pessoa que sofre, que sente, que chora e se emociona, com a mesma pele de galinha que tu e eu, e se angustia como todos nós. Só que... é o Cristiano Ronaldo. Era só isto.
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Crónica de 👇👇
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Comediante, actor, cronista, dobrador, escritor. Bejense e Sportinguista.
brunoferreiraonline.com